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Ulisses Schwarz Viana: “Atuação conjunta das procuradorias será intensificada”

Procurador do Estado de MS em Brasília, Viana despede-se da presidência da Câmara Técnica da Conpeg

Por APREMS
07/12/2020 · Notícias

Em entrevista para a Associação dos Procuradores do Estado de Mato Grosso do Sul (Aprems) o procurador do Estado Ulisses Schwarz Viana, destaca que a década que se inicia, será cada vez mais marcada pela atuação conjunta, coordenada e racionalizada das Procuradorias do Estado com as cortes superiores. 
Neste mês de dezembro, Schwarz se despede da presidência da Câmara Técnica do Colégio Nacional dos Procuradores de Estado e do Distrito Federal (Conpeg), e fez uma análise do trabalho feito nos últimos anos, e da importância da CT do Conpeg.

A atuação dos Estados em demandas com os tribunais superiores têm sido cada vez mais demandada, diante desta realidade, comente sobre o trabalho em grupo feito pelos procuradores do Estado que estão em Brasília, e sobre a importância da cooperação entre estes profissionais.

R:  Nas últimas duas décadas o modelo processual brasileiro passou por várias alterações normativas relevantes, como Emenda Constitucional nº 45, de 31 de dezembro de 2004, que introduziu o instituto da repercussão geral no recurso extraordinário, com vista a julgamentos recursais em massa, promovendo o que denomino de objetivação temática, passando a analisar os recursos extraordinário de modo transcendente, ou seja, pra além dos interesses subjetivos das partes, pelo viés da relevância constitucional política, econômica, social e jurídica. Isto sem esquecer da sistemática dos recursos repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. 
Estas mudanças reestruturantes do sistema processual civil brasileiro trouxe desafios para as Procuradorias-Gerais dos Estados, impondo uma reflexão sobre novos modos de atuação e de organização, colocando a contingência de reformular os trabalhos e buscar caminhos visando ao aumento da efetividade de seu papel e de sua relevante função social, sendo importante recordar que a Advocacia Pública estadual exercida pelas Procuradorias-Gerais dos Estados e do Distrito Federal é uma carreira de Estado, prevista no art. 132 da Constituição de 1988, submetida ao princípio da unicidade orgânica reconhecido pelo STF.  
Trabalhando há 20 anos em Brasília, antigamente na Procuradoria Regional de Brasília, hoje na Procuradoria de Representação em Brasília, fomos vivenciando o crescimento e fortalecimento do fenômeno de formação de precedentes pelos Tribunais Superiores e pelo Supremo Tribunal Federal Esta realidade demandou a criação e instalação em Brasília de setores de todas as Procuradorias-Gerais dos Estados para executarem o acompanhamento, audiências com Ministros das Cortes Superiores.
Isto chamou a atenção dos Procuradores de todos os Estados e do DF para o ressurgimento e aumento de relevância de questões jurídicas ligadas às normas federais ou constitucionais relacionados com problemas federativos de interesse comum a todos Estados e DF. Daí porque por volta de 1998, surgiu um grupo informal, batizado de “Procuradores em Brasília”, que passou a se reunir periodicamente para debater temas que apresentavam dimensões jurídicas de interesse comum a todos os Estados e o DF. Sendo que tivemos a honra e a oportunidade de participar, já no ano de 2000, do nascimento de da atuação em rede da Advocacia estadual na capital da República, com discussões entre as Procuradorias-Gerais dos Estados/DF com representações em Brasília voltada à superação da perspectiva dos conflitos federativos, para um modelo de cooperação federativa na esfera da Advocacia Pública estadual e distrital. 
Foi neste momento que passei a vivenciar a aprender com a atuação processual em rede das Procuradorias-Gerais dos Estado e da PGDF em Brasília. 
Mas, o mais importante evento que pudemos presenciar foi a criação pelo CONPEG de sua Câmara Técnica em Brasília, como instituição composta pelos Procuradores-Chefes das representações de cada PGE e da PGDF, com a escolha de um Presidente, Vice-Presidente e de um Secretário-Geral, com atuação submetida à orientação técnico-jurídica do Colégio Nacional de Procuradores-Gerais, constituindo-se como seu ramo operacional em Brasília, o que gerou maior flexibilidade, efetividade e deu visibilidade ao trabalho que sempre foi realizado de forma dedicada pelas Procuradorias-Gerais dos Estados e do DF em Brasília. 

Esta cooperação de procuradores do Estado, de várias unidades da federação, de uma certa forma, ressignifica o federalismo brasileiro?

R: Gosto sempre de lembrar que o espírito inspirador da criação da Câmara Técnica do CONPEG sempre foi o de promover o valor constitucional da razoável duração do processo (inciso LXXVIII do art. 5º da CF) e do princípio da eficiência na atuação do setor público (caput do art. 37 da CF), cooperando com a atuação e o bom funcionamento dos Tribunais Superiores e do STF, por meio de uma atuação conjunta e bem articulada da Advocacia Pública estadual em Brasília perante as Cortes Superiores  centrada, como já disse, na racionalização da atuação processual dos entes federativos, reduzindo a carga de trabalho de todas as Cortes superiores e do STF, com a ampliação dos horizontes de um federalismo dialógico, com a criação de esferas de discussão plural e democrática de temas federativos de interesse comum. Não canso de ressaltar que a cooperação entre Procuradores do Estado/DF, de todas as unidades da federação, de uma certa forma, ressignifica o federalismo brasileiro.

Com esta demanda cada vez mais intensa nas cortes superiores, sobretudo por causa do fenômeno da formação e concentração de precedentes, quais são os desafios para a advocacia pública estadual para esta década que se inicia?

R: A década que se iniciar será marcada por uma crescente demanda de atuação conjunta,  coordenada e racionalizada das Procuradorias-Gerais dos Estados e do DF em Brasília, junto aos Tribunais Superiores e o STF, avanço que deve ser continuamente aperfeiçoado, a partir dos direcionamentos e das deliberações coletivas dos Procuradores-Gerais de todos os Estados-membros e do DF, agindo como bloco de influenciadores, a partir das visões e experiências da Administração Públicas estaduais e distritais, promovendo a tomada de decisões estabilizadoras de teses jurídicas e uniformizadoras da jurisprudência nas cortes de cúpula do Judiciário brasileiro, trazendo para os debates jurídicos as vicissitudes, dificuldades e necessidade de gerar um ambiente favorável ao desenvolvimento de um setor público capaz de continuar respondendo aos desafios sociais da população, dentro da perspectiva do regionalismo (identificado com a esfera de competência dos Estados), o qual estimula o pluralismo, a inclusão de diferenças étnicas e culturais e, assim, a própria democracia em nosso Estado que é federal, como cláusula pétrea na Constituição de 1988. 
A Advocacia Pública estadual, representada em Brasília pela Câmara Técnica do CONPEG, tem assumido sua verdadeira vocação de ser um dos atores na reformulação do federalismo brasileiro, buscando resgatar a visão regional (estadual) da diversidade de um País de dimensão continental, superando as visões centralistas que ainda impedem o bom desenvolvimento de um verdadeiro federalismo de cooperação. 
Não posso deixar de encerrar citando alguns casos emblemáticos de atuação bem sucedida da Câmara Técnica, na defesa do interesse público estadual e distrital: (1) ações cíveis originárias em que o STF (na rel. Min Rosa Weber) determinou o depósito, em conta judicial, do valor correspondente do Fundo de Participação dos Estados, incidente sobre a multa do art. 8º da Lei nº 13.254/16 (multa da repatriação de recursos); (2) tema 106 dos recursos repetitivos no STJ (Tese firmada: A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: “i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência”); (3) tema 500 da repercussão geral no STF (Tese firmada: “1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido de registro (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão necessariamente ser propostas em face da União”); (4) tema 246 da repercussão geral no STF (Tese fixada: “O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93”); (5) RHC 163.334 STF – criminalização da conduta do devedor contumaz de ICMS; (6) tema 864 da repercussão geral (Tese fixada: “A revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos depende, cumulativamente, de dotação na Lei Orçamentária Anual e de previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias”); (7) tema 822 da repercussão geral no STF (homeschooling); (8) descontingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública em favor dos Estados (ACO 3329), dentre vários outros casos. 

Abaixo, as notas pessoais e o agradecimento de Viana:

NOTAS PESSOAIS
No decurso destes 20 anos de representação do Estado junto aos Tribunais Superiores e na Câmara Técnica tivemos a honra de ocupar a Vice-Presidência da CT na primeira gestão histórica da instituição.
Nos últimos seis anos (2014 a 2020) nos foi confiada a  condução da Câmara Técnica do CONPEG como seu Presidente, em período de muito trabalho e de grande desafios, no a Câmara Técnica teve grandes avanços, notáveis vitórias e também algumas derrotas judiciais, o que é parte da própria natureza da advocacia, mas, de modo muito perceptível, viu-se no trabalho de todos os íntegros e competentes integrantes do Colegiado federativo, que é a Câmara Técnica, um forte impulso na consolidação de seu valor institucional e do amplo reconhecimento conquistado, inclusive por parte de todas Cortes sediadas em Brasília, com as quais há uma relação sólida de respeito e de lealdade processual.
Neste mês de dezembro de 2020, despedimo-nos da Presidência da CT/CONPEG confiantes de que essa importante instituição da Advocacia Pública estadual, sob a batuta do Colégio Nacional de Procuradores-Gerais de todos os Estados e DF, continuará sua missão e seguirá seu caminho, rumo à realização da defesa dos interesses da população. 
O  papel dos Procuradores dos Estados e do DF como agentes de transformação somente crescerá, mormente em uma era de extrema judicialização e de grandes dissensos, que muitas vezes dependem de estabilização de expectativas normativas a cargo das Cortes de cúpula do sistema judiciário de nosso País, exatamente a esfera onde atua a Câmara Técnica do Colégio Nacional de Procuradores-Gerais dos Estado e do Distrito Federal.

Não poderíamos esquecer de expressar nossos agradecimentos e nossa admiração aos integrantes da CT/CONPEG. Sem deixar de saudar a todos os Procuradores-Gerais que integraram e integram o Colégio Nacional (CONPEG). 
Um agradecimento também aos colegas da Procuradoria-Geral do Estado de Mato Grosso do Sul, onde há mais de 26 anos atuo profissionalmente, pelo apoio e estímulo sempre presente.
Por fim, levo deste período a satisfação de ter representado nossa PGE/MS em âmbito nacional e de ter participado, ainda que minimamente, da crescente projeção de nosso querido Mato Grosso do Sul no cenário nacional. 
Muito obrigado a todos.