(67) 3327-2829

Rua Dr. Zerbini, 947 - Chácara Cachoeira

Judith Lageano: “É fundamental a conquista da autonomia administrativa e financeira plena da PGE”

A Procuradora do Estado que vivenciou toda a evolução da advocacia pública de Mato Grosso do Sul, fala sobre a história de PGE-MS, e diz quais são seus desafios

Por APREMS
01/03/2021 · Notícias

A advocacia pública brasileira está em evolução constante, sobretudo desde a promulgação da Constituição de 1988. Em Mato Grosso do Sul, estado entre os mais jovens do Brasil, esta evolução é ainda mais aguda e positiva. 
Poucas pessoas na Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso do Sul podem enxergar o passado, o presente e o futuro da PGE-MS como a procuradora Judith Amaral Lageano. “Pude também trabalhar para a construção do meu Estado, que era relativamente novo na estrutura federativa”.
A Associação dos Procuradores do Estado de Mato Grosso do Sul (Aprems) compartilha com vocês parte da história brilhante de Judith, que inspirou e inspira muitos procuradores, na advocacia pública de Mato Grosso do Sul. Com a autoridade de quem participou de todas as transformações na carreira de Procurador do Estado, ela lembra: “É fundamental a conquista da autonomia administrativa e financeira plena da PGE, como órgão que se mostra cada dia mais fundamental para o bom andamento do Estado e da Administração Pública”.


É uma das procuradoras pioneiras da Procuradoria Geral do Estado. Conte-nos um pouco sobre sua história profissional na instituição e fora dela.

Minha história profissional transcorreu praticamente dentro da PGE-MS, e se desenvolveu, de certa forma, paralela à evolução da própria instituição.
Como sempre menciono quando me perguntam, o desejo de ser Procuradora do Estado germinou ainda nos bancos da Faculdade de Direito, que cursei na Universidade Mackenzie, em São Paulo. Já naquela época, dentre todas as carreiras jurídicas, a que me atraía era a de Procurador do Estado, talvez porque fosse aquela que efetivamente representava o exercício da advocacia.
Então, recém-formada, aconteceu um fato que representou todo o diferencial para que eu realizasse meu sonho. Como sou natural de Ponta Porã, eu soube através do meu pai que iria abrir o primeiro concurso para Procurador do Estado de Mato Grosso do Sul. A carreira estava no nascedouro, e naquele momento, não dava para saber como transcorreria aqui no Estado. De qualquer forma, não pensei duas vezes, voltei para casa, porque na época morava em São Paulo, inclusive, tinha iniciado o curso de mestrado na PUC, e comecei a me preparar para o concurso. Graças a Deus, logrei êxito, e a partir daí passei a me dedicar à PGE, e a me realizar profissionalmente na carreira que foi a escolha de minha vida.
Por essa razão eu disse no início que minha trajetória profissional aconteceu paralela à própria evolução da PGE e da carreira de Procurador, já que a instituição se aperfeiçoa através do trabalho de seus membros. Assim, fui crescendo profissionalmente exercendo minhas atribuições como Procuradora do Estado, e, ao mesmo tempo, fui acompanhando e participando da afirmação da PGE como instituição essencial para a Administração Pública estadual.
Aliás, isso é um motivo de orgulho para mim. Além de exercer o cargo que escolhi, pude também trabalhar para a construção do meu Estado, que era relativamente novo na estrutura federativa. Tanto é que o órgão jurídico estadual máximo estava apenas iniciando a implantação de sua carreira, quando da realização daquele primeiro concurso, vindo logo a seguir a ser estipulada no texto da Constituição Estadual de 1989, a previsão quanto a essencialidade da PGE no âmbito administrativo estadual.
A partir da investidura no cargo, exerci minhas atribuições em vários setores da PGE. Fui inicialmente Procuradora Regional em Ponta Porã, quando atendia toda a região de fronteira, desde Mundo Nova até Porto Murtinho. Depois fui removida para Campo Grande, passando a atuar na Procuradoria de Pessoal, quando então, descobri uma predileção pela matéria, na qual desenvolvi grande parte do meu trabalho como Procuradora, notadamente, na parte consultiva, produzindo inúmeros pareceres, inclusive, muitos de caráter normativo, amealhando uma vasta experiência ao longo dos anos de atividade na área, acompanhando toda a evolução legislativa aplicável aos servidores públicos estaduais. 
Também tive passagens pela PAT (Procuradoria de Assuntos Tributários) e pela extinta PAPI (Procuradoria de Assuntos do Patrimônio Imobiliários), e finalmente, na CJUR-SAD, na qual estou atualmente lotada, no exercício do consultivo principalmente em matéria de pessoal, bem como no apoio à elaboração de leis e decretos voltados para a matéria.

Ao longo da carreira, viu muita coisa mudar na instituição, mas também na advocacia pública. Quais as maiores diferenças entre os tempos atuais e os de outrora?

Eu resumiria nos seguintes aspectos: a consolidação da instituição perante o Estado e a sociedade, no cumprimento de suas atribuições, por meio da atuação de seus membros; a alteração na Constituição Estadual para a previsão do Procurador-Geral escolhido dentre os membros da carreira; e a informatização necessária para o acompanhamento da era digital.
No início da carreira, era comum as pessoas não saberem o que faziam os Procuradores do Estado, que eram facilmente confundidos com membros de outras carreiras.
Evidente que isto ainda ocorre, mas evoluiu significativamente, daí a importância das ações afirmativas tanto da instituição como da Aprems, para o conhecimento da sociedade quanto às atuações da PGE no cumprimento das finalidades do Estado, não apenas no aspecto do contencioso, com as defesas judiciais ou com as ações propostas em nome do Estado, as quais, via de regra, trazem resultados financeiros consideráveis para o erário público, mas também na parte preventiva, nas orientações emitidas diuturnamente para os mais diversos órgãos e entidades que compõem a Administração Pública Estadual, fornecendo o necessário respaldo jurídico  para as decisões a serem tomadas pelo Gestor Público, e, nessa medida, zelando pela legalidade dos atos emanados, em prol da boa Governança, dentre outras atribuições.
Quanto a evolução da carreira em si, esta passou pelo aparelhamento humano e instrumental, de apoio administrativo e de assessoramento, já que evoluímos de um quadro pequeno, com sete procuradores, para o quadro atual, com noventa procuradores, bem como de processos judiciais físicos para os processos virtuais, com a implantação do sistema PGE.net.
Aliás, quero registrar que uma das grandes satisfações que tive na carreira, foi ter recebido, juntamente com meus colegas pioneiros ainda em atividade, Sarah F. Monte Alegre de A. Silva e Rafael Coldibelli Francisco, os demais Procuradores que foram ingressando no decorrer do tempo. Cada um com seu estilo e pensamento, mas todos imbuídos de um espírito de bem servir ao Estado, acrescentando e contribuindo para o crescimento da nossa carreira e da instituição, aos quais devoto o meu maior respeito e admiração.
Também entendo como uma grande conquista a previsão quanto ao Procurador-Geral do Estado ser escolhido dentre os membros da carreira, o que significou, além da valorização e do estímulo para a carreira, a manutenção dos trabalhos de forma contínua e una, sem grandes rupturas no âmbito administrativo interno da instituição na troca de chefias,  muito embora ajustes evidentemente são feitos, conforme a apreciação e o entendimento do novo Gabinete, mas sempre com a primazia do interesse do serviço, o que reverte de forma extremamente favorável para o Estado.
Finalmente, eu diria que foram muitos os desafios ao longo dos anos, desde a estruturação da PGE em termos físicos e de instrumentos de trabalho, até o preenchimento do quadro de Procuradores por meio de concurso, sem falar nas lutas da categoria para o reconhecimento e valorização de nosso trabalho, o que contou sempre com a atuação da Aprems, que tive a honra de compor desde a sua fundação.

O que mudou nas relações entre os cidadãos e o Estado nos últimos anos? As demandas são diferentes?

O que mudou foi o maior conhecimento pelo cidadão quanto aos direitos e garantias individuais e sociais estipulados na Constituição Federal de 1988, e que devem nortear as políticas públicas implementadas pelos entes federativos.
A partir desse conhecimento, que ainda não é pleno evidentemente, mas muito superior ao dos anos passados, o cidadão se tornou mais ativo na busca de seus direitos, e por consequência, houve um incremento considerável no número de demandas sobretudo judiciais, como podemos observar nas ações propostas na área da saúde, da educação, nos direitos do consumidor, na esfera ambiental, e nas mais variadas ações indenizatórias propostas contra o Estado, para citar alguns exemplos.
Especificamente na área preponderante de minha atuação, que é a de pessoal, o servidor público, civil e militar, tem aviado diversas ações contra o Estado no correr dos anos,  pleiteando concessões de vantagens pecuniárias, bem como direitos funcionais como promoção e progressão, contagem de tempo de serviço, além de questionamentos de ordem previdenciária, ou decorrentes da implantação de um novo PCC ou da mudança do sistema remuneratório, enfim, inúmeras ações que são defendidas pela atuação dos Procuradores do Estado, sempre eficientes na busca dos melhores resultados para o ente estatal representado.

Quais serão os próximos desafios para o trabalho de procurador de Estado e para a advocacia pública nos próximos anos?

Eu penso que o maior desafio será o aparelhamento da instituição por meio de mecanismos que possam fazer frente ao volume de trabalho que indiscutivelmente decorre da virtualização dos processos judiciais, bem como do aumento contínuo de demandas,  o que exige velocidade nas respostas aos atos processuais ínsitos ao nosso atual sistema processual, além do constante aperfeiçoamento e capacitação  dos Procuradores e  assessores, extensível à área do consultivo, já que, embora ainda não tenha sido implantado na Administração Estadual o processo administrativo virtual, esta é uma tendência inevitável, ainda mais em época como esta que estamos vivendo de pandemia, com o advento do teletrabalho, o que exigirá, além da questão instrumental, o treinamento de servidores e Procuradores, para a efetiva adequação a esta  nova realidade.
Ou seja, são muitos os desafios pela frente para a advocacia pública, que deverá estar preparada e atenta para acompanhar os recursos tecnológicos utilizados tanto no Poder Judiciário, como na própria advocacia privada, e em outros órgãos e esferas de atuação. Nessa medida, em minha opinião, é fundamental a conquista da autonomia administrativa e financeira plena da PGE, como órgão que se mostra cada dia mais fundamental para o bom andamento do Estado e da Administração Pública, no cumprimento dos princípios constitucionais da legalidade e da eficiência, que se traduzem, em última instância, como a base para o exercício das atribuições dos Procuradores do Estado.


Judith Amaral Lageano é graduada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie. Procuradora do Estado desde 1988. Foi Procuradora Regional de Ponta Porã, Procuradora-Chefe da Procuradoria de Assuntos do Patrimônio Imobiliário, Procuradora-Chefe da Procuradoria de Pessoal, Corregedora-Geral Adjunta da PGE. Atualmente em exercício na Coordenadoria Jurídica da Secretaria de Estado de Administração e Desburocratização.